Eu aposto que sim.
Apesar de parecer algo muito óbvio, acredito que estamos vivendo um período no qual esse tipo de pensamento está mais presente, mais frequente nas suas reflexões diárias. Em todos os aspectos e por muitos motivos.
Eu, por exemplo, não lembro de ficar nessa ansiedade há alguns anos. E não acho que seja apenas por causa da idade – e os sintomas da consciência da nossa finitude – mas também por causa do momento que atravessamos.
E ao refletir sobre minhas reflexões (há!), listei alguns pontos que fazem parte de minha inquietude e que provavelmente fazem parte das suas também.
Aviso aos ansiosos de plantão: o texto é um pouco mais longo do que tinha planejado. Mas acho que vale a pena chegar até o final.
Sente, respire, beba uma água e venha comigo.
1. Pandemia
“Putz, Lau! Vai chover no molhado?”
Tá, eu sei que já se falou de tudo sobre a pandemia. Mas você já parou mesmo para pensar a extensão do impacto dela na sua vida? Óbvio que mudou o mundo, que mudou tudo e mais um pouco. Mas e em sua vida? Você só pensou nos aspectos negativos? Teve aspectos positivos?
O que mudou em sua forma de pensar depois de março de 2020? Suas relações, suas perdas, sua maturidade, sua liberdade, suas prioridades, suas crenças, sua ideia de futuro?
Será que a gente consegue ao menos medir o que esse desvio de rota causou no nosso psicológico?
Quantos comportamentos novos (ou estranhos) você notou em você e nas pessoas de sua convivência?
2. Falta de…propósito
Eu até uso bastante a palavra “propósito” mas ela já ficou bem clichê.
Não dá para negar que ultimamente temos visto uma grande discussão em torno dele, principalmente no contexto de trabalho. Gurus, coachs, líderes, mestres, têm apresentado caminhos e metodologias para buscarmos o propósito, uma razão, um Ikigai. Sem ele a sua vida vai girar em torno da perdição e da infelicidade.
O fato é que há uma grande propaganda em torno da “busca pelo que te faz feliz”. Eu não sou contra isso mas o discurso parece sugerir que você tem que largar tudo o que te incomoda e identificar aquilo que só te traz prazer ao trabalhar.
Gente, isso não existe. Pelo menos pra mim.
Sempre vai ter problema, percalços, clientes sem noção, chefes beócios, sensação de tempo perdido, discordâncias. E tudo isso pode ser pelo simples fato de que você esteja medindo o mundo com a sua régua. Não tem como saber as motivações reais ou estratégias corporativas para algumas coisas acontecerem.
E se a cada entrave você quiser “largar tudo” ou ficar pensando na megasena para mudar de vida…
Muitas vezes não é “falta de propósito” e sim o apego ao discurso da felicidade constante.
3. Fragmentação da atenção
A moeda mais valiosa do mundo atualmente é a sua atenção.
As empresas fazem de tudo para que você, mesmo sem a consciência disso, entregue toda a atenção que puder para os seus produtos e serviços. É um verdadeiro bombardeio de estímulos desleais que sofremos a todo momento.
E o pior é que acreditamos que o melhor lugar para se estar nessa guerra da atenção é no meio do tiroteio, ostentando com orgulho (mas sem consciência) a condecoração do FOMO (Fear of Missing Out – ou medo de estar desatualizado em tradução livre). Daí nossa atenção ser tão fragmentada e acharmos de verdade que somos multitarefas.
E isso só é possível graças ao próximo tópico.
4. Hiperconexão
A hiperconexão acontece até mesmo quando você está dormindo. Tem aplicativo que mede a qualidade do seu sono – através do seu celular ao lado da sua cama ou do smartwatch no seu pulso. Estamos incessantemente conectados e gerando dados que estão circulando por aí, na nuvem.
Não temos tempo para identificar e interpretar nossos reais sentimentos. Nossas reais experiências. Estamos ocupados deslizando na timeline ou tirando selfies para construirmos nossa identidade com a aprovação alheia. Passamos o dia alimentando nosso “digital self”, que é muito mais real e tem muito mais memória do que nossa existência material.
O nosso vazio existencial aumenta à medida que a completude do nosso digital self também aumenta.
E eu nem vou comentar sobre as crianças e adolescentes. Deixo para um próximo artigo.
5. Relações superficiais
Não é à tôa que as relações passam a ser mais efêmeras, voláteis, superficiais. Assim como a gente já tinha o hábito de zappear entre os canais da extinta televisão (que hoje é apenas mais um suporte para a internet), trocamos de videos no youtube, de posts em blogs, de feeds no instagram, de dancinhas no tiktok, com a mesma facilidade com que damos ou não match no aplicativo de “relacionamento”.
A tolerância e a empatia com os pares são as coisas mais raras de se encontrar atualmente.
O critério de seleção começa pela sua aparência. Aliás, na maioria das vezes é assim mesmo, né? Se a estética agrada, joga pra direita. Se não, joga pra esquerda.
Com essa mesma “facilidade” os casais reavaliam namoros, noivados, casamentos, histórias de vida juntos. Principalmente depois dos 30 anos.
A construção é individual agora. É egoísta. Eu quero ser feliz e você tem o privilégio de estar ao meu lado me fazendo feliz sendo perfeito(a). Caso contrário…deslizo pra esquerda.
Em tempo: na amizade é a mesma coisa.
“Próximo(a)!”
6. Algorítmos
Bobinhos…vocês acreditam que estão lendo esse artigo porque acharam o título interessante?
Nahhh…quem determinou essa leitura foram os algorítmos. A gente já ouviu falar. Só não sabe que bicho é esse, né?
Os algorítmos são a forma digital de Deus. São eles que determinam o destino de sua vida, suas escolhas, suas felicidades, suas tristezas, suas relações, suas experiências, sua aprovação social. Enfim, já entenderam, né? Os algorítmos são o seu “livre arbítrio”.
Não tem muito como escapar. E mesmo que você tenha a real noção sobre isso, uma pergunta resta: você gostaria mesmo de escapar?
Segundo um cantor famoso: “Narciso acha feio o que não é espelho”.
7. Voz (e vez) aos idiotas
Você pode até não concordar com tudo o que eu disse até agora. Mas taí algo que você não vai discordar: a internet – e todos os seus desdobramentos – deu voz aos idiotas. E isso te irrita.
Quantas e quantas vezes você já se deparou com absurdos ou imbecilidades ao longo de suas jornadas por timelines? Militâncias, preconceitos, vergonhas alheias, bullying, mentiras e tantas coisas mais.
Sou contra a relativização de tudo mas será que nosso critério de rotulação para a imbecilidade não está diretamente relacionado com nossas referências e gostos pessoais?
Tipo: todo mundo tem acesso e fala (quase) tudo o que quer. Inclusive você.
Ou seja, para outras pessoas você pode ser um…gênio. 😉
Mas voltando aos idiotas, talvez essa newsletter seja um bom exemplo disso. 😀
Tudo isso causa, na forma mais branda, a ansiedade, a inquietação, a depressão, a insônia. E todos esses tópicos estão intimamente relacionados. Uma coisa puxa a outra.
É por isso que eu acredito que você tem refletido bastante sobre a sua vida. Talvez não diretamente sobre os tópicos que listei.
Mas sobre essa inquietação que nos aflige enquanto pintamos nossa grama de verde diariamente.
E para não dizer que eu só trouxe mais inquietações e nenhuma resposta, segue um exercício que eu faço ao final do dia e que me ajuda bastante: uso um “planner digital” que tem uma seção onde eu escrevo respostas para as seguintes perguntas:
- O que me irrita?
- O que me deixa ansioso?
- O que me empolga?
- Pelo que sou grato?
Obviamente isso não vai resolver os seus problemas mas o fato de você escrever, tirar da sua cabeça e colocar no…”virtual”, vai ajudar a você ter mais clareza sobre o que está acontecendo na sua vida.
Foi por essas e outras que em 2015 montei um curso (que era presencial) e que se chama Vida Digital, que abordava essas e outras questões. Basicamente sobre como viver em uma sociedade hiperconectada. Ao longo desses últimos anos muita coisa mudou e preparei uma atualização supimpa para esse curso (que agora é online, claro!), com uma turma que começa agora em maio de 2022. Se você tiver interesse em conhecer um pouco mais, clica aqui. A pré-inscrição é gratuita. Nem dói.
A ideia é hackear quem está te hackeando. Hehehe.
Bom, se você chegou até aqui e não estava pensando na sua vida, agora está. 😉
Siga em frente. Sempre.
E até o próximo acampamento.